quinta-feira, 29 de junho de 2006

Casamento

Essa noite eu sonhei que me casava. Com direito a festão, vestido branco e tudo mais. Eu. Isso é assustador.
O pior é que eu acordei e fiquei sem saber quem era o meu noivo.
Instinto materno ainda vá lá, mas querer casar a essa altura do campeonato? Isso não!
O engraçado é que terminado o casório eu voltei pra casa. Nada de noivo nem de lua-de-mel. Só eu, mesmo...

quarta-feira, 28 de junho de 2006

O moreno

Uma e meia da tarde saí do ginecologista e fui para a parada de ônibus.
Sentei ao lado de um rapaz moreno, de cabelos curtos e alguns primeiros fios brancos.
Não gosto muito de paquerar, mas ele percebeu o meu interesse e começamos a conversar.
Atrás de nós estavam sentados dois mórmons barulhentos. Acho que queriam que todos no ônibus soubessem que eles eram gringos. Até hoje não entendi qual é a dos mórmons.
Quando me dei conta estava beijando o moreno. Descobri da pior maneira que não é algo muito confortável beijar alguém dentro de um ônibus em movimento.
Ao olhar novamente para o rosto dele me arrependi imediatamente do que tinha acontecido. Ele sorria para mim e perguntou-me se eu queria ser sua namorada.
Arregalei os olhos e aleguei que nem o conhecia. Ele ficou furioso. Só não me chamou de santa.
O ônibus chegou na minha rua e puxei a cordinha para descer. O moreno segurou o meu braço e começou a me ameaçar.
Consegui me desvencilhar dele, desci correndo até a minha casa.
Quando estava abrindo o portão, o ônibus dobrou a esquina.
Acordei.
Levantei-me, puxei a cordinha e vim andando até a minha casa.

sábado, 24 de junho de 2006

Sentada no chão da minha casa ela admitiu que só estava comigo por interesse. Eu fingi que já sabia e disse que não me importava com isso. Eu gostava de estar com ela e acreditava que agüentaria me sujeitar à humilhação que fosse para ficar ao seu lado. Hesitou um pouco quando propus que continuássemos como estávamos, mas cedeu. Dessa maneira ela poderia continuar com seu plano inicial.
O que eu não sabia era que machucava mais estar ao lado dela enquanto pensava em outro, do que estar longe, me alimentando de um amor platônico. Aos poucos uma angústia tomou conta de mim, como se eu tivesse cólicas eternas. Toda vez que eu me deitava com ela podia ouvir seus pensamentos chamando o nome de outro homem. Chamei-a pelo nome da mãe dela, só para irritar.
Hoje estamos casados e com dois filhos.

quinta-feira, 22 de junho de 2006

Hippie

Era dezembro e eu juntei o que sobrava do meu décimo terceiro para viajar com uma amiga. Escolhemos uma praia ao norte do estado, linda, cheia de turistas. Meu sonho era encontrar um homem nórdico que quisesse me levar para passar o resto das férias na Suíça. Acho que essa minha cara de indiana não atrai muito os gringos, porque flertei a torto e a direito sem ganhar um beijinho sequer a noite toda.
No dia seguinte resolvi não esquentar com os homens e bebi litros e mais litros de cerveja. Quando me dei conta, estava achando que era o Gene Kelly, pulando nas poças d’água no meio da rua. Na hora não esquentei muito, achei que os suíços podiam gostar de um pouco de excentricidade brasileira.
No nosso terceiro dia na praia fui acometida de uma dor de cabeça lacerante e resolvi maneirar um pouco na bebida. Sóbria, aproveitei para visitar a feirinha de artesanato, de repente comprar um brinco, um colar... Enquanto eu passeava desinteressada fui abordada por um hippie, que segurou a minha mão e começou a me fazer um anel no formato de coração. Eu não me incomodei com as investidas dele, pelo contrário, algo naquele homem alto, moreno, descalço, cheio de dreads e tatuagens me agradou. O quê que é o mistério. Quando me dei conta estava atracada com ele no meio da rua.
Ao invés de um nórdico, eu fui dormir aquela noite com um hippie piolhento.

quarta-feira, 21 de junho de 2006

Solidão

Certo, uma prece: por motivos sentimentais. Deus Todo-Poderoso, lamento ser agora um ateu, mas o Senhor leu Nietszche? Ah, que livro! Deus Todo-Poderoso, vou jogar limpo nesta questão. Vou Lhe fazer uma proposta. Faça de mim um grande escritor e eu voltarei à Igreja.
Pergunte ao pó, John Fante


Puxei a cordinha do ônibus e desci na Prata. Olhei ao meu redor, mas não encontrei ninguém me esperando lá. Fui até a arvorezinha da esquina e me encostei nela para esperá-lo. Estava sem relógio e não tinha noção do tempo, mas imagino que tenha ficado esperando uma meia hora. Nesse meio tempo passou um carro cheio de homens fazendo gracinha para mim. Fechei a cara e olhei para o lado oposto.
Por mais que eu fizesse força para ter raiva dele, escancarei o sorriso quando o vi chegar. Deu-me um beijo no rosto e levou-me pela mão até sua casa. Senti um frio na espinha ao entrar lá. Tinha cheiro de homem. Fazia tempo que eu não sentia esse cheiro. Senti uma nostalgia maravilhosa. Passamos direto pela sala e fomos ao quarto dele. Afastou as cuecas e as meias jogadas em cima da cama para que eu me sentasse. Então começamos a nos beijar.
Ao fim da tarde ele vestiu as calças e acendeu um cigarro. Olhei para o lado e vi suas costas nuas. Sentei e comecei a me vestir. Quando eu já estava pronta, vestiu uma camisa branca, calçou as havaianas e abriu caminho até a parada do ônibus. Ao chegarmos ao ponto, beijou-me a testa e falou:
- Até amanhã.