quarta-feira, 30 de junho de 2010

Dedos gelados

Estou com as pontas dos dedos geladas. Dizem que é exagero sentir frio aqui no nordeste, que aqui não existe inverno de verdade. Talvez, comparado aos invernos siberianos, o daqui seja realmente apenas uma brisa fresca. Mas eu, eterna moradora de regiões tropicais, não tenho o direito de sentir frio na minha terra natal? Devo esconder meus dedos gelados e fingir estar acostumada a uma temperatura de 20°? Tudo bem, me critiquem, mas umas luvinhas viriam a calhar.
Mas mais do que as mãos, gostaria de aquecer meus pés. Faz tempo que não tenho senão meu edredon para fazê-lo. Isso me incomoda demasiado, mas o que posso fazer? Boto a bota, as mãos nos bolsos e saio pro mundo, à procura nos becos e bares mais improváveis. Lá encontro para me aquecer o álcool, o fumo, a música, a dança e os ambientes fechados. Aí o calor vem pra lascar. Então, com meus pés suando e com os pelos dos meus braços comportados, esqueço a tempestade gélida que tenta se apoderar do interior do meu corpo e não me choco mais com a minha temperatura.
Passo a procurar olhares cálidos, mas não há acordo entre os frios e os quentes. Talvez por culpa minha, mas talvez não. Por fim desisto e olho para o alto. Para a música, para a luz, para o céu. E passa por mim um corpo frio, outrora quente, outrora frio, outrora quente. Finjo que sou também um corpo frio. E ele, como um cubo de gelo, passa escorregadio ao meu lado, deixando apenas um rastro úmido.
E a noite se estende, meu corpo quente finge ser frio e seu corpo frio, em algum momento, finge ser quente. Nossas temperaturas não mais se encontram na tentativa de trocarmos calores à procura de uma sensação tépida, desejo que sim, mas espero que não.

sábado, 19 de junho de 2010

Eu não preciso de você

Com as mãos trêmulas segurava o telefone, desejando que ele tocasse, para que não fosse necessário que ela própria fizesse a ligação. Mas é claro, o telefone não tocou, ele nunca toca. Procurou na agenda, com o corpo estremecendo de tanto nervosismo, o nome dele. Parou por segundos intermináveis a fitar esse nome, momentos finais antes da decisão de ligar efetivamente. O telefone começou a tocar e seu coração palpitava como se quisesse fugir pela boca. Os pelos do braço se eriçavam como os de um cão de guarda atento à chegada de um estranho. Ela divagava nos seus pensamentos, criando todo um diálogo perfeito, onde ela dizia tudo que estava emperrado na epiglote.
- Alô?
Ele atendeu ao telefone. Ela mal conseguia falar, tamanho o nervosismo.
- Oi, é a Isadora.
- Oi, tudo bom? – ele, cordial como quase sempre.
- Levando, e você?
- Estou bem.
- Que bom.
Deu-se então um silêncio ensurdecedor.
- Então, por que você ligou? – disse ele finalmente.
- Eu precisava falar com você.
Nova pausa. Dessa vez ela recomeçou.
- Preciso saber o que você pensa de mim.
Uma pausa dele. Precisava escolher bem as palavras.
- Por que?
- Porque eu gosto de você.
Mais uma pausa no diálogo. A voz dela estava trêmula, como se seu coração estivesse descompassado por uma caixa de som gigante direcionada diretamente para o seu peito.
- Olha, Isadora... Eu nem sei como te dizer isso, mas... Eu não to a fim de namorar, saca?
- Sei... Eu já imaginava. Na verdade eu só queria saber o que você pensa de mim. De verdade. É importante. Não gosto de ser mal interpretada.
- Mal interpretada como?
- Tenho a impressão de ter seguido uma sucessão de erros desde a primeira vez em que estivemos juntos. Agi dessa maneira porque qualquer migalha de atenção que você me desse era suficiente para me satisfazer. Mas depois desse tempo todo, tenho a impressão de que o tiro saiu pela culatra.
- Como assim?
- Acho que causei uma impressão errada a você.
Silêncio.
- Por isso preciso saber o que você pensa de mim.
- Pô, eu... eu acho você massa, inteligente, divertida...
- Fácil?
- Oi?
- Você me acha fácil? Periguete?
- É essa a sua preocupação?
- Sinceramente, é.
- Você não devia se preocupar com esse tipo de coisa.
- É, eu também pensava assim. Mas aí eu vi que você me tratava como uma periguete.
- Eu?
- Sim.
- Pô, eu nem sei o que te dizer.
- Me diz se você acha que eu sou uma periguete.
- Eu não faço esse juízo das mulheres. Se eu achasse que você era uma periguete, em primeiro lugar, jamais teria ficado contigo.
- Mas você não me respeita.
- De onde você tirou essa ideia?
- Você não age como se me respeitasse, simples.
- Eu acho que você está equivocada.
- Você faz ideia de como eu me senti da última vez que a gente se viu? Você lá cheio de agarrados com outra, tão pouco tempo depois. E nem pra falar direito comigo.
- Eu já te falei, eu não estou a fim de namorar.
- Uma coisa não tem nada a ver com a outra. É uma questão de respeito.
- Olha, só, me desculpa, mas a gente vai ter que continuar essa conversa outra hora. Tenho que sair agora pra resolver uns negócios...
- Sei.
- Depois a gente se fala, tá?
- Tá.
- Tchau.
- Tchau.
Ela não se arrependeu de ter feito a ligação. Sentiu muita raiva, claro, mas era provavelmente o que ela precisava para se convencer de que precisava esquecê-lo. Todas as suas amigas já tinham cansado de repetir que ele não valia nada, não valia a pena, que ela merecia algo melhor. Ela também sabia disso. Mas gostava dele a ponto de não querer esquecê-lo.
Agora não. Agora ela tinha uma raiva incontida dentro dela. Precisava se vingar. Iria apaixonar-se por outro.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Roubadas

- Amiiiga, esqueceeeeeeeeeeeeeeeeeeeeee ele e seja feliz! Happy, happy! Quem falou que a gente precisa de homem pra ser feliz? Hum? Hum?
- Eu? Hiuehiauhuiehuiheuiahe. Mas então, eu sei que ele não é o homem que vai me fazer feliz, mas é mais forte do que eu. Enquanto não aparecer outro que me tire ele da cabeça vou ficar nessa.
- Hahahahahahaha! E o amigo da sua mãe?
- O gay de 45 anos? Tá falando sério? Aehuihieuhuaiheiuahieuh, não sei qual roubada é maior.