segunda-feira, 6 de maio de 2013

Autobiografia de uma desconhecida VII


7. O templo da vodka

Eu sempre, durante toda a minha vida, senti que tinha menos dinheiro do que precisava para manter meus hábitos. O engraçado é que eu sempre fui extremamente pão duro (e até motivo de chacota eventualmente por causa disso). Independente do quanto recebesse, de mesada ou salário, sempre foi (um pouco?) menos do que eu precisaria para viver tranquilamente.
Na adolescência, quer dizer, quando eu fiz dezoito anos, porque eu nunca fiz nada ilegal na vida, minhas amigas vinham para a minha casa todos os sábados para matar uma garrafa de vodka (coisa que a gente nunca conseguiu, uma garrafa geralmente dava para duas noites) e depois ir para a finada Feirinha de Tambaú, ficar dando voltas para ver os rostos conhecidos e desconhecidos do lugar.
Por motivos econômicos, acabamos por ter momentos inesquecíveis (dinheiro não traz felicidade e coisa e tal). Minha casa sempre foi um ponto de encontro, desde os tempos dos meus pais, passando pelos meus irmãos e por fim, por mim (e nesse meio tempo tornou-se também ponto de encontro pra metade da cidade, mas essa é uma conversa à parte). Invariavelmente, minha amiga de infância era a primeira a chegar. E enquanto eu me decidia se usava gola rolê ou meia-calça arrastão (em plena João Pessoa), elas iam chegando, uma a uma para começar os trabalhos.
Éramos as gabrieeelas (eu nasci assim, eu cresci assim...), ao todo cinco, com algumas agregadas ocasionalmente. Jogávamos poker, bebíamos vodka com refrigerante, suco ou refresco e de vez em quando baixava a Frida Kahlo em alguém que resolvia entornar a garrafa depois de gritar “more tequila!”, mas no fim das contas, quase sempre tinha alguém que passava do ponto, ou pelo menos foram esses dias que ficaram marcados na minha memória (não há graça de lembrar dos dias onde todas se comportaram perfeitamente).
Também nos acompanhava sempre um pequeno sapo de pelúcia chamado Catota, que usava uma corrente fechada com cadeado de diário à la Sid Vicious. Foram momentos felizes que deixaram saudades, mas o tempo é cruel e voa mesmo que a gente não queira. Não tenho mais o mesmo corpo, não tenho mais o mesmo tempo nem a mesma disposição(?), com algumas praticamente perdi o contato, mas tenho certeza de que hoje em dia conseguiríamos matar uma garrafa daquelas.

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